sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Entre o Desenho e a Realidade

Já é sabida a importância do desenho para a criança.

Uma das principais funções do desenho no desenvolvimento infantil é a possibilidade de representação da realidade. Para a criança, o desenho corresponde à sua forma de ver o mundo. Representar o mundo, com suas situações e objetos no papel, é uma maneira de compreender, elaborar e se apropriar dos elementos do dia a dia.

"Quando uma criança veste uma roupa de mãe, admite-se que ela esteja procurando entender o papel da mulher", explica Maria Lúcia Batezat, especialista em Artes Visuais da Universidade Estadual de Santa Catarina (Udesc). "No desenho, ocorre a mesma coisa. A diferença é que ela não usa o corpo, mas a visualidade e a motricidade."

Desta forma,  algo que está dentro da criança pede passagem para fora. Muitos teóricos caracterizam este processo como um jogo simbólico.

É certo também que certa dose de imaginação permeia estas produções. Como mostrou Henri Wallon (1879-1962) em seu conceito sobre sincretismo, o pensamento da criança se caracteriza pela ausência de diferenciação entre as informações que ela recebe do meio, as experiências pessoais e a fantasia.

Somando todas estas características, o desenho adquire um caráter altamente expressivo, sendo fundamental o reconhecimento de sua importância no cotidiano.

A partir destas ideias, mostro dois trabalhos interessantes. Ambos nos questionam sobre a expressividade presente nos desenhos infantis, sobre a realidade e a fantasia e sobre as relações estabelecidas entre elas.

O artista coreano Yeondoo Jung fez, em 2005, uma série fotográfica chamada Wonderland. Esta série
teve como proposta trazer para a realidade desenhos feitos por criança.




Durante quatro meses, Jung supervisionou aulas de arte em quatro jardins de infância de Seul, e coletou cerca de 1200 desenhos de crianças, entre 5 e 7 anos de idade. Selecionou 17 desenhos, interpretando a mensagem social contida em cada um deles. Depois, recrutou cerca de 60 adolescentes para participarem das fotografias.

Wonderland transforma desenhos em realidade sem o auxílio de programas de computador. Tudo é feito manualmente, como o cenário de um teatro.




A obra de Yeondoo Jung nos coloca diante da realidade, dos hábitos e da cultura de forma fantasiosa, permeados pelos olhos de uma criança.





Ao transformar a situação desenhada em algo real, o conteúdo do desenho se intensifica, tornando-se explícito aos olhos do adulto. A liberdade de expressão presente nos desenhos das crianças nos convida a ver a sociedade e a vida cotidiana de uma maneira nova. Sua estranheza estética, induz ao questionamento e à reflexão.



Outro trabalho que me chamou a atenção  foi a produção da Child`s Own Studio. Sua proposta é dar vida aos personagens desenhados pelas crianças, transformado-os em bonecos macios feitos de pano ou pelúcia. Neste processo, o que conta é a originalidade presente em cada desenho e a surpresa ao vê-los fora do papel.



 É preciso valorizar, entender e estimular o desenho. Em qualquer idade. Em qualquer lugar.


Para saber mais acesse: http://www.yeondoojung.com
                                      http://www.childsown.com

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Carimbos de Borracha - por Nathália Pelicho e Raquel Fukuda

A oficina Carimbos de Borracha tinha como objetivo aproximar as crianças do processo artístico da xilogravura, recriando-o na borracha.

Xilogravura é uma palavra de origem grega. Destrinchando-a temos: "xilon", que significa madeira, e "grafos" que significa gravar, escrever. A xilogravura é uma técnica de gravura na qual a madeira é utilizada como matriz, sendo talhada por goivas ou outros instrumentos. A imagem produzida na matriz (madeira) pode ser impressa diversas vezes sobre papel ou outro suporte adequado.

Na oficina, primeiramente, as crianças exploraram seus desenhos, buscando aquele a ser transformado em carimbo.





Após selecionado o desenho, as crianças o refizeram na borracha e a talharam, utilizando goivas como instrumentos.


Depois de pronto, era só carimbar.




Esta oficina ocorreu no Sesc Osasco, e foi destinada à pais e filhos.

Nathália Pelicho é Bacharel em Arte Visuais.
Raquel Fukuda é Bacharel em Artes Visuais, trabalha em produtoras de animação 2D e 3D, e é curadora do FILE ANIMA.

Veja também Desenho com Carimbos

domingo, 16 de setembro de 2012

Teresa Viana e as Possibilidades da Pintura - Propostas de Atividades

Após reconhecer no trabalho da artista Teresa Viana um viés, para apresentar as possibilidades da pintura às crianças de 4-5 anos, (ver Teresa Viana e as Possibilidades da Pintura - Introdução) fizemos as seguintes atividades:

Pela percepção das linhas e das cores intensas presentes na obra da artista, fizemos recortes/colagem de papéis coloridos em tamanho gigante. Cada turma que chegava, ia acrescentando recortes de linhas coloridas à colagem.




Fizemos uma pintura sobre tela, buscando a estética observada nas obras. Utilizamos tinta plástica, o que conferia uma viscosidade maior da tinta.




Partindo para as massas, utilizamos massinha de modelar, esticando-a e amassando-a dentro de molduras já prontas. Criou-se assim a percepção da massa como possibilidade presente na arte.



E, fizemos uma massa colorida, misturando farinha, sal, cola, água e tinta guache para, finalmente, chegarmos aos relevos tão presentes nas pinturas da artista.




Depois de prontas as massas, as crianças aplicaram-na em um suporte de madeira branco. Novamente, cada turma que fazia a atividade, ia adicionando suas massas coloridas sobre o suporte, até ela ficar inteiramente revestida.




Dentre tais atividades, as crianças puderam inovar no tamanho e no formato de seus trabalhos, explorar os sentidos tanto visuais quanto táteis, além de ampliarem seu repertório estético.

Todo este processo, resultou numa bela exposição!

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Os Livros de Bruno Munari


Em 1981 o artista, escritor, designer, arquiteto, educador e filósofo Bruno Munari (1907-1998), publicou Da Cosa Nasce Cosa, na Itália. Recentemente, li este livro e, apesar dele discorrer basicamente sobre design, há dois capítulos bem pertinentes de serem tratados aqui.


Nos capítulos "Um Livro Ilegível" e "Os pré-livros", Bruno Munari desenvolveu ideias interessantes sobre os livros. Ele questionou a função social dos livros, tanto no que diz respeito ao seu conteúdo quanto ao seu formato enquanto objeto.

Suas ideiais foram tão frutíferas e originais que, facilmente, podemos reconhecê-las na literatura infantil atual.  

Em "Um Livro Ilegível",  Munari defende que o livro pode ser compreendido somente por sua visualidade, abolindo o texto. Desta forma, o papel que antes era utilizado somente para a impressão de palavras, torna-se o cerne da comunicação e conteúdo do livro.

 "O objetivo desta experimentação foi verificar se é possível utilizar como linguagem visual o material com que se faz um livro (excluindo o texto). O problema portanto é: o livro como objeto, independentemente das palavras impressas, pode comunicar alguma coisa, em termos visuais e táteis? O que? (....) Procuram-se assim, então, todos os tipos de papéis possíveis, desde os papéis de impressão aos de embrulho, dos transparentes aos texturizados, ásperos, lisos, reciclados; papel velino, parafinado, de alcatrão, plastificado, de celulose pura, de retalhos, de palha, vegetal, sintético, macio, rígido, flexível, etc. Essa simples pesquisa já leva a descobertas, pois se um papel é transparente, comunica transparência, se é áspero, comunica aspereza. Um "capítulo" feito com folhas de acetato (usadas por arquitetos e engenheiros nos projetos) dá uma sensação de neblina. (...) Em suma, cada papel comunica sua qualidade, e isso é já uma razão para ser usado como comunicante. Trata-se então de relacionar esse conhecimento com os outros que vão resultar da experimentação."

Além dos tipos de papéis, Munari também propõem uma mudança no formato do livro, em suas dimensões e formatos.

"Faz se outra experiência sobre o formato das páginas. Páginas iguais comunicam um efeito de monotonia; páginas de diferentes formatos são mais comunicativas."

Abaixo, um dos livros ilegíveis de Bruno Munari.



Foram destas experimentações que nasceram "Os Pré-Livros".

Acreditando na importância dos livros para a formação das pessoas, Munari cria os Pré Livros para crianças até de 6 anos de idade. Esses livrinhos são construídos com materiais diferentes e todos tem o mesmo nome LIVRO.

"Sabemos que nos primeiros anos de vida as crianças conhecem o ambiente que as rodeia por meio de todos os seus receptores sensoriais, e não apenas através da visão ou da audição, percebendo sensações táteis, térmicas, sonoras, olfativas... podia-se projetar um conjunto de objetos parecidos com livros, mas todos diferentes, para a informação visual, tátil, material, sonora, térmica; todos do mesmo formato, como os volumes de uma enciclopédia que contém todo o saber ou, pelo menos, muitas e diferentes informações."




Cada livro oferece, a quem o manuseia, uma experiência diferente, uma mensagem diferente.

                                      

Como objetivo destes pequenos livros, Munari defende que "É preciso, desde cedo, habituar o indivíduo a pensar, imaginar, fantasiar, ser criativo. Eis porque esses livrinhos não são mais do que estímulos visuais, táteis, sonoros, térmicos, materiais. Devem dar a impressão de que os livros são objetos assim, com muitas surpresas dentro. A cultura é feita de surpresas, isto é, daquilo que antes não se sabia, e é preciso estarmos prontos a recebê-las, em vez de rejeitá-las, com medo de que o castelo que constuímos desabe."

Sem dúvida, Munari foi um excelente artista e educador, e soube captar com sabedoria, as necessidades das crianças.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Desenho debaixo da mesa

Arte, corpo e criança formam a tríade fundamental para pensar atividades em arte e educação. Principalmente, no que se destina à Educação Infantil.

Sempre que busco uma proposta diferente, procuro priorizar este aspecto, essa união do corpo com o fazer artístico. Atualmente, encontramos diversos livros e autores que enfatizam este olhar.

Anna Marie Holm já nos disse isso no livro Baby Art e Stela Barbieri nos reafirma essa união no livro Interações: Onde está a arte na infância?, de onde extraí este parágrafo:

"Na arte contemporânea existe um espaço privilegiado para se discutir as questões relativas ao corpo. Muitas obras utilizam o corpo do artista e a percepção corpórea do espectador como partes de sua constituição. O corpo também é espaço privilegiado para as crianças pequenas. Para elas, nada é mais natural do que experimentá-lo. É comum que queiram passar por lugares bem estreitinhos; se desafiar no espaço, experimentar seu corpo de outro jeito - as aulas de artes podem se tornar um espaço de experimentação."

E é impressionante como atividades como essas dão certo, e as crianças, realmente aproveitam.

Um dia, propus às crianças que fizéssemos desenhos debaixo da mesa. Exatamente lá, naquele lugar muitas vezes proibido.

Coloquei papéis debaixo da mesa de forma bem simples, grudando-os com fita crepe.




Depois, explicava a elas o local aonde estavam os papéis, para desenhar daquele dia. Elas já se animavam. Em algumas salas, nas quais as crianças não haviam me visto preparar a atividade, eu as instiguei a procurar os papéis pela sala.  Elas nem desconfiaram que poderia estar debaixo da mesa.

Enfim, com um material bem simples, começou a atividade.


Com exceção de bem poucos, todos se animaram em ficar debaixo da mesa, desenhando.
Para uns, o movimento era constante. Sai de uma mesa, troca de giz, entra em outra etc. Já outros, adoraram a possibilidade de desenhar deitado.


E, como professor também tem que participar, lá fui eu também pra debaixo da mesa.
Parece que lá embaixo tudo muda. Todos estão deitados. Você só vê seus rostinhos interessados nos seus desenhos, pedindo outros, gostando de estar lá.
Adorei e recomendo.